Não se pode amar e ser feliz ao mesmo tempo (Myrna) - 2002
É no Diário da Noite, em 1949, que surge o
pseudônimo, Myrna. Esta mulher, de duração meteórica, oito meses apenas, causa
furor nas páginas do jornal — primeiro no consultório sentimental,“Myrna
escreve”, respondendo às cartas de leitores, sobretudo das leitoras, pois Myrna
é expert nas questões do coração. E é esta persona que escreve o
romance em folhetim A mulher que amou demais, veiculado também no ano de
1949. Não se pode amar e ser feliz ao mesmo tempo é uma reunião
de algumas das “cartas” desta coluna. Na pele de Myrna e de Suzana Flag, vemos
aflorar um escritor que “fisga” seu leitor, sem constrangimento, perambulando
tanto pelos caminhos de uma sensibilidade ímpar quanto espreitando o clichê
mais banal. É essa a literatura de Nelson Rodrigues — feita de grandes
mulheres. Suas personagens femininas são sempre fortes: amam, sofrem, traem,
desejam, se submetem, conquistam ou “se deixam perder”. As mulheres de Nelson
dão e são o ritmo, a voz narrativa de sua liturgia.
Trecho do livro:
Há, em amor, um problema sem possibilidade
de solução: — o do ciúme. Quem ama sente, fatalmente, ciúme. Com ou sem
motivos. Isso tem sido assim através dos tempos. Muita gente diz: — “Ciúme é
falta de confiança.” Seja e não importa. Na minha passagem pelo mundo, venho
constatando o seguinte: os amorosos que têm confiança não são amorosos. Ou,
pelo menos, não conhecem, ainda, o amor. Observei, também, o seguinte: — quem
ama desconfia, sempre.
(Trecho do texto “É uma delícia o ciúme sem
motivo”)