Críticas

Teatro no Rio


"Senhora dos Afogados" na dramática nacional - Uma grande notícia para os que sentem o teatro como um problema de arte e de cultura - "Senhora dos Afogados" está incluída no repertório da Companhia Dramática Nacional, para este ano. Em fins de maio, veremos a tragédia brasileira que impressionou profundamente uma autoridade mundial como Barrault. E justiça se faça ao Sr. Aldo Calvet, diretor do S.N.T., que não teve medo dos problemas de montagem que o texto de Nelson Rodrigues suscita. A dramática Nacional existe para isso mesmo, para tentar as grandes realizações cênicas, para empreender as grandes experiências dramáticas. E assim, todos os elementos técnicos e artísticos da companhia, se concentram em torno de "Senhora dos Afogados". Um texto excepcional exige um espetáculo também extraordinário.

 

Mas vejamos as características desta tragédia brasileira. É, sem dúvida, uma peça que nasceu sob o signo do debate. Antes mesmo da prova decisiva do palco, já se movimentam seus apologistas e detratores. Entre os primeiros, estão algumas de nossas maiores figuras literárias, como Gilberto Freyre, Manuel Bandeira, Prudente de Morais Neto, Raquel de Queiroz, Otávio de Faria, José Lins do Rego, Joaquim Cardoso, José Geraldo Vieira. Estes já a conhecem de leitura, e proclamam o alto nível literário e dramático da peça, e as sugestões plásticas inesquecíveis que povoam o texto. Há, ainda, o referido testemunho de Barrault. Sagaz e experiente, ele foi sensível às qualidades raras e específicas de "Senhora dos Afogados". Segundo Barrault, a obra de Nelson Rodrigues é uma teatralidade profunda e irresistível. Quanto aos que negam a tragédia, são muitos, também. Alguns nem leram a peça, mas antecipam, assim mesmo, o julgamento. Outros são alérgicos a Nelson Rodrigues, e refutam os valores tradicionais de sue teatro. Mas este clima polêmico é vital para o autor de "Vestido de Noiva", e sua obra perturbadora e apaixonante.

 

Alguns leitores solicitam um resumo de nossas idéias sobre "Senhora dos Afogados". É o que tentaremos fazer. "Senhora dos Afogados" representa, como diz Ziembinski, a obra suprema de Nelson Rodrigues. Sua estrutura poderosa, o rigor de sua frase, sua autenticidade dramática -, exprimem uma maturidade, uma plenitude, um metier realmente impressionantes. Pode-se objetar que se ressente de uma tristeza, densa, obstinada e vital. Mas vamos e venhamos: - não seria cabível uma tragédia desopilante. Por outro lado, parece-nos falso exigir que o teatro seja estimulante como um biotônico qualquer. O desespero de "Senhora dos Afogados" não constitui nem um defeito nem uma qualidade, mas uma característica irredutível. O que se deve notar, no caso, são os termos cênicos e dramáticos, dentro dos quais o autor construiu sua obra. O grande teatro é aquele que parece mais que uma simples imitação da vida. Dir-se-ia a própria vida, a vida mesma, múltipla, selvagem, crespa e fatal. Diante de "Senhora dos Afogados" talvez se produza na platéia a seguinte impressão: - de que seus personagens "vivem" realmente, ao passo que nós, apenas "imitamos" a vida. Certas obras significam mais do que simples experiências estéticas. Elas se incorporam de maneira tão definitiva, que se transformam em lastro vital, para cada um de nós. É o caso, a nosso ver, de "Senhora dos Afogados".

 

Depois do recuo do T.B.C., que não teve coragem de montá-la, a Dramática Nacional assume uma responsabilidade bem grave na encenação da tragédia. O texto tem, em si, todos os elementos para um espetáculo estupendo. Falta apenas realizá-lo com sensibilidade, imaginação e inteligência. Para dirigir "Senhora dos Afogados", foi convidada Bibi Ferreira. Com sua juventude, ela poderia ficar temerosa da imensa complexidade da montagem. Mas, não. Os problemas técnicos e artísticos, longe de a assustar, importaram num altíssimo estilo. Bibi lançou-se ao trabalho e está vivendo em função de "Senhora dos Afogados". O cenógrafo, já escolhido, é Santa Rosa. Em permanente contato com Bibi, ele procura e vai encontrando as soluções cênicas mais exatas.

 

Os principais papéis estão assim distribuídos: - Moema (Sônia Oiticica); D. Eduarda (Natália Timberg); Misael, (Fregolente); Noivo, (Narto Lanza); Paulo, (Carlos Melo); Vendedor de Pentes, (Magalhães Graça); Sabiá, (Ferreira Maia); Avó, (Wanda Marquetti).

 

"Senhora dos Afogados" será a quarta peça da temporada, devendo estrear, como já dissemos, em fins de maio.

 



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Sobre

Nelson Falcão Rodrigues nasceu no Recife, em 23 de agosto de 1912, o quinto filho de uma família de catorze. Quando tinha três anos, seu pai, Mário Rodrigues, foi tentar a sorte no Rio de Janeiro, capital da República. O combinado era que tão logo encontrasse trabalho, chamava a família para ir a seu encontro. Maria Esther, sua esposa, não agüentou esperar. Em 1916, empenhou as jóias e mandou um telegrama para o marido, já avisando do embarque naquele mesmo dia. Nelson conta, nas "Memórias" publicadas no "Correio da Manhã", que se não fosse a atitude da mãe, o pai jamais teria permanecido no Rio.