Entrevistas

Entrevista com Stella e Maria Clara Rodrigues


Na Casa dos Rodrigues 

A mãe de Nelson, Maria Esther, tinha sido filha única e sempre dizia que quando casasse queria ter doze filhos. Acabou tendo quatorze: sete homens e sete mulheres, com espaço de cerca de dois anos entre um e outro.

Quando moravam na Rua Alegre, na Aldeia Campista, primeiro endereço da família Rodrigues no Rio de Janeiro, depois de terem deixado o Recife, os filhos se distribuíam entre três dos quatro quartos da casa. Havia também uma sala de almoço, onde as crianças costumavam fazer suas refeições. Na sala de jantar, comiam os adultos.

Depois, foram morar no Parque Guinle, lá seu pai recebia convidados diariamente e a mesa estava sempre cheia. Não se fazia refeição para menos de vinte pessoas. Todo dia era almoço de domingo e Nelson tinha o costume de entrar na cozinha para roubar comida. 


Meu irmão Nelson.... 

As irmãs Stella e Maria Clara descrevem Nelson como espontâneo, generoso e inteligente - "muito inteligente", enfatiza Maria Clara. Stella afirma que ele era bastante sentimental. Em suas conversas, Nelson falava sobre o seu trabalho, contava os progressos nos ensaios das peças e, algumas vezes, chegava a fazer confidências. 

Era brincalhão e muito carinhoso, principalmente com a mãe. Com as irmãs, tinha a maior preocupação, todo o cuidado de um irmão protetor. Maria Clara explica o motivo de tanta atenção: 

- Ele sabia como os homens eram, por isso se preocupava. 

Mesmo com tanto zelo, não interferia nas escolhas das irmãs. Nunca fez comentários sobre noivos ou maridos. Sempre preferiu guardar para si as opiniões. 

A exceção foi quando Dulce, irmã caçula, começou a fazer teatro. Nelson foi totalmente contra. Depois, ao ver a obstinação da irmã e seu desempenho em cena, não só aceitou a situação, como ficou satisfeito. Dulce chegou a ser a protagonista de "Valsa nº 6". Para as irmãs, a principal característica de Nelson era a bondade. 


A Morte de Roberto Rodrigues 

A família Rodrigues sempre foi muito unida e, talvez, por isso, tenham conseguido sobreviver a tantos infortúnios e dificuldades, como o assassinato de Roberto, o período da fome e o desabamento do prédio onde morava Paulinho. Até a morte da mãe, em 1973, os filhos e netos reuniam-se todos os anos para a ceia de Natal, no dia 24 de dezembro. Depois de 1973, a ceia foi substituída por um almoço, no dia 25. Mas o Natal nunca deixou de ser comemorado, apesar de Roberto ter sido baleado em um dia 26.

Nelson nunca mencionava, por exemplo, o nome da assassina de Roberto, quando escrevia sobre o assunto, pois pensava como devia ser triste para um filho ler no jornal o nome de sua mãe ligado a um crime. O respeito do dramaturgo à dor do filho da assassina de seu irmão é ainda mais comovente se for levado em conta o fato de que Nelson foi testemunha do crime e viu Roberto agonizar durante três dias. Dias nos quais a família manteve a fé na recuperação, enquanto o próprio Roberto parecia ter perdido as esperanças. 


Nelson e a ditadura

Nelson apoiou a ditadura militar e era amigo do presidente Médici, que governou de 1969 a 1974, os chamados anos de chumbo. Stella, que considerava o irmão uma das pessoas mais bondosas que ela já conheceu, explica que essa amizade surgiu de uma credulidade excessiva de Nelson. 

Segundo ela, na época, o presidente havia dito a Nelson que tinha horror à tortura e qualquer coisa que ocorresse no país, naquele período, era feito à sua revelia. Com a declaração de Médici, os dois puderam ficar amigos.


Pornográfico? 

As irmãs de Nelson Rodrigues nunca se incomodaram com a fama de pervertido atribuída a Nelson. Até hoje acham que esse tipo de comentário só pode ser fruto da insanidade de quem acusava o irmão. "Tarado era quem chamava ele de tarado", afirma Maria Clara.

Nem Maria Clara, nem Stella tinham restrições ou se espantavam com os enredos rodrigueanos, carregados de incestos, traições e paixões violentas. Para Stella, o irmão escrevia com realismo: 

- Ele procurava ser realista, porém, como todo bom escritor, tinha lá suas imaginações. Se, às vezes, ele não o era totalmente, era por excesso de valor.

Stella sublinha a capacidade imaginativa de Nelson, enquanto Maria Clara destaca seu poder de observação. "Muito das histórias escritas eram baseadas em personagens da vida real". 


Como Nelson reagia às críticas... 

As irmãs Stella e Maria Clara nunca se incomodaram com as críticas severas feitas à dramaturgia do irmão. Mas o mesmo não pode se dizer dele.... Elas lembram, rindo, que quando a crítica era negativa, Nelson acusava seus detratores de "imbecis". 

Só em um caso ele concordou: na avaliação de sua experiência como ator. O maior dramaturgo do teatro brasileiro se dizia o "pior ator do mundo". 



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Sobre

Nelson Falcão Rodrigues nasceu no Recife, em 23 de agosto de 1912, o quinto filho de uma família de catorze. Quando tinha três anos, seu pai, Mário Rodrigues, foi tentar a sorte no Rio de Janeiro, capital da República. O combinado era que tão logo encontrasse trabalho, chamava a família para ir a seu encontro. Maria Esther, sua esposa, não agüentou esperar. Em 1916, empenhou as jóias e mandou um telegrama para o marido, já avisando do embarque naquele mesmo dia. Nelson conta, nas "Memórias" publicadas no "Correio da Manhã", que se não fosse a atitude da mãe, o pai jamais teria permanecido no Rio.